noticias.terra.com.br
Isaac Ismar
Direto do Rio de Janeiro

Um grupo de adeptos do candomblé fez uma homenagem à Iemanjá nas areias de Copacabana por volta das 20h desta quinta-feira. A estátua do orixá, considerada como a rainha do mar por seus devotos, foi carregada na frente do cortejo, que passou pelo palco principal montando nas proximidades do Hotel Copacabana Palace. Continue reading »

Correio Brazilienze
Em visita a Brasília, autoridade religiosa da Nigéria anuncia a abertura de um templo que amplia as opções para o aprimoramento do culto ao deus africano das adivinhações, Ifá-Orunmilá
Leilane Menezes

Desde sua fundação, Brasília atrai místicos, sensitivos e seguidores das mais variadas crenças. Há quem diga que a construção da nova capital pode ter sido orientada por mentores espirituais. Confiante na veracidade dessa vocação para o ecletismo religioso, um rei nigeriano esteve na cidade na última semana para dar início ao projeto de implantação de um novo templo, conhecido mundo afora como Floresta Sagrada. Vestindo trajes africanos em tom amarelo e segurando um cajado, o obá Gbadebo Adeoba, 82 anos, foi recebido por senadores e deputados. O novo espaço será dedicado ao culto do deus Ifá-Orunmilá — senhor da adivinhação e base de todas as religiões de matriz africana cultuadas no Brasil — em Brasília. No local, Adeoba garante que o brasiliense poderá ter consultas espirituais para, entre muitas outras finalidades, conseguir adiar o dia da própria morte, curar-se de doenças e escapar de acidentes por meio das previsões de um oráculo.

Adeoba é um dos três maiores líderes espirituais africanos no mundo e também tratou de temas referentes ao Dia Mundial da Consciência Negra (dia 20 próximo) com os congressistas. A visita foi coordenada pelo Centro Cultural Ase Omo Oduduwa e pelo Instituto Brasil Floresta Sagrada. Na qualidade de representante de ancestrais africanos, o convidado veio também trazer apoio institucional à aprovação do Estatuto da Igualdade Racial e à implementação da lei que institui o ensino da cultura e da história afro-brasileiras nas escolas públicas.

Ele é considerado rei na região de Mafisa Ogbomosho Oyo, na Nigéria. O sumo sacerdote é o terceiro na hierarquia mundial do culto de Ifá-Orunmilá. Ser um obá significa estar no nível mais alto do culto — como o papa está para a igreja católica — e pertencer a uma tradicional família de reis. Em sua nobreza, ele não dispensa as reverências. Os seguidores curvam-se diante de sua presença e o cumprimentam com um toque nos pés e um beijo nas mãos. Desde 1998, o obá mantém no Brasil um grupo de pessoas iniciadas por ele na filosofia e no culto a Ifá.

A expectativa é de que o primeiro templo seja instalado em Brasília, em um local não revelado, mas já definido, até setembro de 2010. A vinda do obá tem como objetivo acelerar a negociação com o governo. Quem pretende receber formação religiosa no Ifá-Orunmilá, atualmente, precisa viajar à África. Há somente dois iniciados no Centro-Oeste. Apenas os homens são aceitos e as mulheres participam de cultos especiais. A legião de seguidores já soma mais de 200 mil adeptos, grande parte deles em Brasília. Obá hospedou-se em uma mansão no Lago Sul, de propriedade de uma de suas admiradoras, uma bailarina. Os adeptos desse culto acreditam haver um destino escrito para cada pessoa. O oráculo serve para ajudar a fazer com que ele seja cumprido. Os iniciados garantem: é possível, sim, adiar o dia da própria morte. Basta receber a orientação certa para seguir o melhor caminho.

De acordo com o obá, o objetivo do Ifá-Orunmilá é trazer equilíbrio à vida das pessoas, bem como evitar que elas percam tempo. As visões aparecem após consultas a um oráculo, composto por búzios e outros “instrumentos divinantes”, ele explica. “A previsão se revela como em um vídeo na cabeça do iniciado”, resume Adeoba. Pessoas costumam buscar a ajuda de obás e babalawos, os maiores sacerdotes do Ifá, antes de viagens, de aceitar um emprego, quando te mem acidentes ou casamentos malsucedidos. “Já vi muita gente escapar de acidente porque consultei o oráculo e ele viu alguma tragédia”, garante o babalawo nigeriano Sola Johnson, seguidor do obá Adeoba, que atende em Brasília, São Paulo e Recife.

Cura
Em Masifa Ogbomoso Oyo, o obá tem status de governante. Além disso, sua residência vive cheia de pessoas à procura da solução para enfermidades. A saída para os problemas aparece, segundo o obá, por meio de conhecimentos transmitidos pelos ancestrais via oráculo. Obás e babalawos podem cobrar pelo serviço — “mas apenas o que o homem ou mulher puder pagar”, garante Sola. Segundo o babalawo, é possível ver no oráculo quem será o marido ou a esposa de uma pessoa, se o futuro companheiro é negro, branco, alto e quantos filhos vai ter. “É o oráculo que fala. Sem as peças não consigo fazer previsões. Não somos videntes”, completa.

Adeoba não encontrou dificuldade em ser recebido por políticos. Eles são alguns dos principais clientes de obá e seus babalawos. Segundo Adeoba, não são poucos os homens engravatados que ocupam lugares no Congresso Nacional a apelar para as visões mostradas em oráculos, que supostamente aparecem para os iniciados nesse culto. Procuram os babalawos um busca de orientação espiritual para ganhar eleições ou garantir a saúde da família.

Entidade da luz
O culto africano Ifá-Orunmilá deu origem a todas as religiões de base africana no Brasil. Orunmilá é a divindade que representa a luz, aquele que tem poder de alterar o dia da própria morte ou promover mudanças de caráter. É um santo muito respeitado no culto orixá. O Ifá é a lei divina, o sistema onde o divino se manifesta.

Canal com o destino
Os babalawos são estudiosos do Ifá-Orunmilá que se comunicam diretamente com o Odu, que é o destino da pessoa. O odu é mais forte que o orixá. Os religiosos desse culto com formação inferior à dos babalawos não têm conexão direta com o Odu.

Surpresas para Brasília
O rei Gbadebo Adeoba diz sentir uma “energia muito positiva” em Brasília. “A cidade ainda pode trazer muitas coisas boas para o Brasil”, afirma. Ele faz um pedido aos governantes: “Peço paz e harmonia e que olhem com mais atenção para os problemas do povo”. Previsões para 2010, só a partir de 1º de dezembro. “Antes disso, não dá para sentir a energia do próximo ano no oráculo”. O babalawo Sola garante que o obá nunca errou previsões. “Ele previu que Eduardo Campos ganharia para governador de Pernambuco e Lula seria eleito presidente”, afirma. E em 2010? Quem será eleito governador do DF? E presidente da República? “Ainda é muito cedo para dizer. Mas podem esperar uma surpresa muito grande”, adiantou Sola.

Há apenas dois babalawos no Centro-Oeste iniciados na África. Um deles, Sebastião Fernando da Silva, 48 anos, garante ser o único brasiliense. Ele se formou em 2001. “Tive vontade de conhecer o culto depois de descobrir que meu avô era iniciado em Ifá”, diz. “Procurei me formar na África porque no Brasil há muitas distorções do culto. Aqui, os pais de santo atuam como clínicos gerais, tratam de todas as divindades. Lá, eles formam especialistas”, explica.

As casas de pais e mães de santo prosperaram em lugar do culto original do Ifá-Orunmilá. “No Brasil criou-se a autoridade de pai de santo, mas é o babalawo quem está acima de qualquer orixá”, relata Sebastião. Ele acredita na instalação de uma Floresta Sagrada em Brasília para dar orientação a todos os praticantes de cultos originários do Ifá, como o candomblé, por exemplo. “A Floresta Sagrada funciona como uma reserva ambiental, com colégios e cursos para conscientização do homem como parte da natureza. E, é claro, como um espaço para a iniciação de novos seguidores, não só no campo religioso, mas no filosófico”, explica Sebastião.

Glossário
Babalorixá ou Baba: quer dizer pai. É um sacerdote, chefe de um terreiro. Faz consultas aos orixás por meio do jogo de búzios. Conhece os segredos das folhas sagradas da natureza. É o mais comum no Brasil e atua na falta de um babalawo.

Babalawo: chefe supremo do jogo de Ifá, está abaixo apenas do obá. Tem conexão direta com o Odu.

Obás: são os chefes tradicionais de assentamentos, pertencentes a famílias de reis. Seriam os papas do Ifá-Orunmilá.

Odu: é o destino escrito para uma pessoa, somente revelado por meio do oráculo.

Oráculo: nenhuma previsão é feita antes de consultar esse método de adivinhação. Usam-se búzios, tábuas sagradas e elementos da natureza, como pó de árvore, entre outros.

Orixás: deuses africanos que correspondem a pontos de força da natureza.

O Estado de Sao Paulo
Biaggio Talento

Salvador – O bispo Sérgio Santos Corrêa e os pastores Gilberto Muniz Pereira e Marco Aurélio Mendonça da Trindade todos da Igreja Universal do Reino de Deus foram denunciados à Justiça da Bahia por discriminação religiosa pelo promotor de Justiça e Cidadania do Ministério Público Estadual Lidivaldo Brito.

É a primeira vez que membros da Igreja são denunciados à Justiça por esse motivo no Estado. Os acusados realizaram vários ataques ao Candomblé no programa “Ponto de Luz”, exibido pela TV Itapoan (Record) de Salvador. Pelo mesmo motivo, Brito informou que pretende se aliar a Procuradoria da República para requerer em conjunto a apreensão do livro “Orixás, Guias e Caboclos” de autoria do chefe supremo da IURD, Edir Macedo.

A principal peça de acusação do promotor é a edição programa “Ponto de Luz” do dia 9 de janeiro em que os evangélicos apresentam uma suposta ex-mãe-de-santo que afirma ter feito um “trabalho” de macumba para matar um desafeto e este, conforme a mulher, teria morrido.

No programa várias pessoas participam se dizendo arrependidas por algum dia ter professado a religião afro e garantem que ela é associada ao diabo. Além do “Ponto de Luz”, Brito também tomou o depoimento de vários praticantes do Candomblé que tiveram terreiros atacados por evangélicos e acusam a campanha da Igreja Universal de incitar esses atos.

Numa outra frente, o promotor requisitou ao Juizado de Direito da Vara da Infância a suspensão do “Ponto de Luz”, alegando que o programa é exibido num horário muito cedo (a partir das 13 horas) apesar de conter cenas fortes, de exorcismo e ataques às religões afro. “O programa não foi submetido a análise de classificação de faixa etária pelo Ministério da Justiça”, informou Brito.

Caso sejam condenados pela Justiça os pastores podem pegar penas que variam de 2 a 5 anos de prisão. “A liberdade de culto está assegurada pela Constituição e a religião afro-brasileira é protegida pela Constituição Estadual”, disse, lembrando que se o Candomblé não fosse importante para a sociedade, terreiros como o da Casa Branca, o Ilê Axé Opô Afonja e o do Gantois não seriam tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).

Conforme Brito, o crime dos pastores é agravado pelo fato deles terem veiculado suas ofensas num meio de comunicação poderoso como a televisão.

v

JB Online
Mãe Cidália, respeitada no Candomblé, chega à capital
Larissa Guimarães, Repórter do JB

Os atabaques, tambores africanos indispensáveis nos cultos do candomblé, tocarão mais alto nos terreiros de Brasília a partir de terça-feira. É que uma das filhas religiosas da famosa Mãe Menininha do Cantuá, a Mãe Ebomy Cidália de Iroko, chega na capital federal pela primeira vez no dia 4. Ela é uma das figuras mais respeitadas do Candomblé na Bahia e no Brasil. A abaigena do Cantuá (espécie de irmã antiga da casa, que cuida de diversas questões do terreiro) terá encontros com a maioria dos pais e mães-de-santo de Brasília e participará de diversas festividades em casas de Candomblé da cidade.

– Quero visitar os amigos e levar paz e axé à Brasília, a força maior – diz a abaigena.

Na agenda de Mãe Cidália estão marcados encontros com autoridades ligadas ao Meio Ambiente e, possivelmente, uma audiência com o ministro da Cultura, Gilberto Gil. Entre os assuntos que deverão ser tratados, está a criação de um parque para o culto de árvores sagradas.

Mãe Cidália é filha do orixá (deus ou força da natureza) Iroko, ligado ao culto das árvores e da natureza. Segundo estudiosos do candomblé, Iroko é um orixá raro, que esteve prestes a ser esquecido tempos atrás. O culto a Iroko foi difundido em terreiros do Rio de janeiro por Mãe Cidália e, assim, reavitalizado.

– Iroko é um orixá muito difícil de dar nas pessoas e tenho muito orgulho disso. Do mesmo jeito que tenho orgulho de ter sido criada no Candomblé e de ser negra – conta Mãe Ebomy Cidália, que também faz parte do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade negra da Bahia.

O ministro Gilberto Gil e sua mulher, Flora Gil, o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), os cantores Maria Bethânia, Caetano Veloso e Daniela Mercury e o publicitário Duda Mendonça são apenas alguns dos ilustres que passaram pela casa de Mãe Menininha do Cantuá. O centro ficou muito conhecido pelo atendimento a diversos políticos de renome em Salvador.

Amigos e conhecidos de Mãe Ebomy Cidália dizem que ilustres de Brasília já demonstraram interesse em consultá-la. Mas essas consultas ainda não foram confirmadas.

– Ela é uma pessoa de grande importância para a história do Candomblé. A visita de Mãe Cidália vinha sendo muito esperada – conta a Ia-Ebé (mãe da comunidade) Cláudia de Ogum.

Entre os nomes dos babalorixás (pais-de-santo) e yalorixás (mães-de-santo) que aguardam a chegada de Mãe Cidália, encontra-se figuras conhecidas e respeitadas do candomblé de Brasília como Pai Pedro de Oxóssi, Pai Agnelo de Xangô, Mãe Marisa de Oxum e Mãe Iracema de Omolu.

– Ela representa parte da história do Candomblé. Conheceu três grandes escalões de sacerdotisas do culto, incluindo Mãe Menininha. Foi ela (Mãe Minininha) inclusive que iniciou Mãe Ebomy Cidália na religião – explica o babalorixá Ronaldo de Oxum do Ileaxé Ope-afonjá, um dos mais conhecidos pais-de-santo de Brasília.

Mãe Ebomy Cidália, hoje com 72 anos, chegou à casa de Mãe Menininha do Cantuá aos oito. A sacerdotisa é conhecida por religiosos como mulher de grande sabedoria e inteligência.

– É um nome amado e muito respeitado por todos os terreiros do Brasil. É umas das pessoas mais sábias do culto hoje, dotada de uma inteligência extraordinária – diz o Ogan (espécie de auxiliar de sacerdote no candomblé) Roberval Marinho, também doutor em Artes e Comunicação.

A casa de Mãe Menininha é de longe o mais conhecido terreiro da Bahia. O Cantuá surgiu de outro terreiro, o Ilê-axé Iya Naso, a mais antiga casa de culto de candomblé, com cerca de 300 anos. O nome Cantuá veio da palavra francesa Gantois, aportuguesada. Segundo estudiosos, Gantois era o nome da família francesa que vendeu o terreno onde hoje funciona a casa do Cantuá. A fundadora foi a yalorixá Maria Júlia Nazaré, que abriu o terreiro em 1849.

Apesar dos longos anos, Mãe Ebomy Cidália é conselheira de grande parte dos terreiros de Salvador. O nome Ebomy quer dizer minha irmã mais velha em Iorubá, um dialeto africano. Mãe Cidália é mentora de um dos mais famosos e respeitados babalorixás da Bahia, Augusto Cézar de Logun Edé. E também troca figurinhas com outros grandes terreiros, como o Pilão de Prata do Pai Air José, também consultado por políticos de Salvador.

– Não tenho terreiro de Candomblé aberto, mas como sou muito solicitada tenho o mesmo trabalho que uma mãe-de-santo – explica.

Correo da Bahía
Devoção de pescador
Cerca de 40 mil pessoas participaram da grande festa no mar para saudar Iemanjá, no Rio Vermelho
Pablo Reis

O presente dos pescadores à deusa das águas foi uma réplica do Farol da Barra

A réplica do Farol da Barra, que era um segredo do pescador Zé Coió, 58 anos, virou oferenda. E de presente se transformou em ponto culminante da Festa de Iemanjá, ao ser levada para o mar no final da tarde de ontem pelo saveiro Rio Vermelho. Se fosse apenas o ato de conduzir ao oceano uma maquete de um ponto turístico de Salvador, a festa já teria o mérito de renovar uma tradição de 76 anos. Mais do que isso, o presente de Iemanjá também representa a crença de milhares de devotos e o legado profano de uma festa de largo de grande porte, a única que resiste com grande força, em conjunto com a Lavagem do Bonfim. Segundo estimativa da Polícia Militar, aproximadamente 40 mil pessoas lotaram a orla do Rio Vermelho, ontem.

Flashes de fé e pura diversão, devoção e total algazarra compõem o curso das homenagens à rainha das águas no 2 de fevereiro. A fila com centenas de metros de gente tentando deixar seu mimo (de um ramo de rosa a uma boneca gigante) em um dos 350 balaios disponibilizados pelos pescadores da Colônia Z-1 é uma das principais provas da veneração. A orixá considerada deusa do Rio Ogum, na Nigéria, originariamente uma negra gorda símbolo de fertilidade, encontrou na confiança dos baianos o motivo de um altar marinho. “Ver essas três filas de pessoas que não medem esforços para oferecer suas lembranças é uma satisfação grande”, vibra Eulírio Menezes, conhecido como Tenente, 75 anos, organizador há 20 do cortejo marítimo.

A fala de Tenente coincide com a chegada de quase 300 embarcações nas proximidades da praia de Santana. Na fila onde não há cansaço, reclamação ou desistências – apenas ansiedade -, Celita dos Santos, 56, aguarda sua vez de depositar um arranjo de flores amarelas no balaio. “Desde os 15 anos, cumpro esse ritual. Antes eu colocava diretamente na escuna. Quero pedir paz para o país e proteção para a minha família”, revela. No meio da confusão em frente ao Largo de Santana, blocos de improviso, grupos de amigos uniformizados e charangas, muitas delas, contribuem para dar o caráter eclético à manifestação democrática. De uma idéia surgida em um ano de carestia para os pescadores (1927), nasceu o acontecimento que, 76 anos depois, seria sinônimo de abundância, fartura em apelo popular.

Mistura – Em uma comemoração exclusiva do candomblé, o sincretismo não está presente em sua versão religiosa. A mistura é de tipos, amálgama de classes sociais, caldeirão de objetivos que vão de uma simples tarde de curtição e paquera a um momento de obrigação mística, passando por estratégias de marketing. A ONG Paciência Viva, por exemplo, aproveita a oportunidade para promover um arrastão com uma brasilianista mistura de música, futebol e artes plásticas. Com jogadores da seleção baiana de Beach Soccer e o afoxé Caxerê executando o eclético repertório de ijexá e hip-hop, maracatu e baião, Paciência Viva é uma das entidades que busca atrair adeptos para suas causas, no caso deles, as sócioambientais.

No barracão de abrigo ao presente principal para a dona das águas, baianas entoam cânticos diferentes, em seqüências intermináveis de músicas feitas em dialetos africanos. Tudo é preparação ritualística para a entrega da oferenda. O prefeito Antonio Imbassahy, um dos personagens obrigatórios no 2 de fevereiro, repete, pouco antes das 17h, seu ato de depositar uma composição de flores no caramanchão. Na tradição de Iemanjá, o presente pode ser símbolo de agradecimento ou moeda para um pedido. “Eu sempre venho agradecer e prestigiar essa festa, que é uma das mais impressionantes em participação popular no Brasil”, esclarece Imbassahy, acompanhado da mulher, Márcia. “Mas para pedir algo, teria que ser uma sociedade cada vez melhor”, completa.

Oferendas – Os balaios, à medida que ficam repletos de perfumes de alfazema, sabonetes, espelhos, escovas, pentes, bonecas e qualquer outro objeto que possa servir à vaidade de Iemanjá, vão sendo conduzidos por pescadores aos saveiros. O afoxé Filhos de Gandhy, representado por quase três mil integrantes, também carrega seus axés. “Tem dado certo, ela não falha com seus filhos”, confia Ademir Santos Silva, 30 anos, trajado com a vestimenta branca típica, a sandália, o torso e os colares. Ele, como milhares, tem relação longínqua com a devoção, desde que era criança e a tia, Olga Ferreira da Silva, participava da produção da festa.

Até para quem conhece o evento pela primeira vez e não tem pendores religiosos, a beleza é contagiante. “A fé dessas pessoas emociona”, resume a estudante Carolina Mendes, 19 anos, enquanto o caramanchão é carregado pela areia da praia e levado até a embarcação. Os aplausos da multidão são efusivos. A mistura de sensações é intensa e uma mulher incorpora alguma entidade e é apoiada pelo pai que assopra o ouvido. Na orla, sons se confundem. Uma música de discoteca tocada por um DJ em um barzinho da moda que armou um pequeno palanque e o hino interpretado por um coral infantil: “Dia dooois de fevereeeeiro/ Dia de festa no mar/ Eu quero ser o primeeeeiro/ A saudar Iemanjá”.

O saveiro com o presente principal, seguido por centenas de outros, ruma em direção a um ponto incerto, seis milhas mar adentro. Com eles, os agradecimentos pela proteção da dona das águas e os pedidos de fartura para mais um ano. Na beira, um quase-diálogo entre amigas se transforma no cúmulo da credulidade: “A casa dela é linda, cheia de conchas e areia, toda enfeitada de flores”. Diante do olhar incrédulo da companheira, a complementação: “Você acha que tanta gente assim iria dar presentes se não fosse verdade?”.

Estado.Com.Br
Flores e perfumes enchem balaios de oferenda a Iemanjá
Baianos e turistas enfrentam longa fila para cumprir ritual de entrega dos presentes à deusa das águas
Hildete Santana

Quem não chegou cedo ao Rio Vermelho para entregar sua oferenda no caramanchão onde estavam os balaios que seguiriam no final da tarde para o alto-mar precisou de paciência redobrada para esperar longos minutos na fila. Por volta do meio-dia, o bairro já estava lotado, e muitos retardatários preferiram colocar os presentes direto na água para não perder tempo e nem ficar em falta com a deusa das águas salgadas. Marília Fontes mora na Pituba, bem perto dali, mas não abre mão de levar o agrado a Iemanjá no local tradicional. Era para ter chegado cedo, mas a feijoada que minha família estava esperando ficou salgada, eu fui dar um jeito e acabei perdendo o horário. Agora eles vão ter que me esperar para começar a festa, brincou.

Mas a festa já estava nas ruas. Nas transversais que dão acesso à praia, centenas de ambulantes se esforçavam para conquistar compradores para a cerveja gelada, a preço médio de R$1,50 a lata. Refrigerantes e garrafinhas de água mineral podiam ser encontrados a R$1. Para comer, havia de tudo: desde os tradicionais acarajé e abará, churrasquinho, cachorro quente, feijoada e outros pratos mais pesados, como o xinxim de bofe, vendido em residências e bares. No entanto, a clientela só cresceu mesmo a partir das 13h.

Até esse horário, os vendedores de flores eram os mais requisitados. Baldes de rosas, principalmente vermelhas e brancas, chamavam a atenção. A unidade era vendida a R$1 e, eventualmente, aparecia algum ambulante mais afoito, ou esperto, dando saída rápida à sua mercadoria por até R$0,50, a rosa. Mas isso aí não é exatamente uma rosa, é um botão, bradava Olívia do Espírito Santo, 47 anos. E a senhora acha que Iemanjá vai se importar com isso? O que vale é a intenção, respondeu o vendedor Valdir Mendes Couto.

Mesmo assim, houve quem reclamasse do preço das flores. Joana Nascimento preferiu tirá-las do quintal. Não são tão bonitas, mas fazem o mesmo efeito. Além do mais, eu também estou trazendo um vidro de alfazema, um espelhinho e um pente. Não falta nada, disse satisfeita.

Estado.com.br.
Baianos fazem festa na Lavagem do Bonfim
Biaggio Talento

SALVADOR – Vestidos de branco, como manda a tradição, milhares de baianos e turistas enfrentaram calor de 35 graus na manhã de ontem para homenagear Nosso Senhor do Bonfim, o santo mais popular da Bahia, na festa da Lavagem do Bonfim. O cortejo comandado por 300 baianas tipicamente vestidas saiu da Igreja da Conceição da Praia, por volta das 10 horas, chegando à Colina Sagrada às 12h20, após 8 quilômetros de marcha animada pelo afoxé Filhos de Gandhy, batucadas e cordões.

Várias autoridades como o senador Antonio Carlos Magalhães, o governador Paulo Souto e o prefeito Antonio Imbassahy (todos do PFL) caminharam com as baianas. Uma repórter da TVE, diante do alvoroço em torno do senador, definiu, em plena transmissão ao vivo: “Ele significa, digamos assim, o Senhor do Bonfim”. Depois dessa “canonização”, ele disse que pediria inspiração ao santo para seu novo mandato no Senado.

A festa começou na segunda metade do século 18, e, no século 19, os adeptos do candomblé passaram a identificar o santo católico com o orixá Oxalá.

Há mais de cem anos, a lavagem, que era feita dentro da igreja, preparando-a para a missa de domingo que encerra o novenário, passou a ser feita apenas na parte externa e nas escadarias.

Água-de-cheiro – Com a igreja fechada, a lavagem assumiu caráter pagão, na visão da Arquidiocese, mas não na do povo, que participa com fé da homenagem. Isso pode ser comprovado quando as baianas lavam o adro da igreja com a água-de-cheiro que levam em jarros floridos. Os participantes da festa disputam gotas dessa água. Alguns fazem o sinal da cruz, como se recebessem água benta.

Neste ano, a festa em frente da igreja teve um show do Coral das Crianças de Salvador, que se apresentou das cinco janelas de cercadura de pedra da Igreja do Bonfim. Carroças, patinadores, mamulengos e pessoas com fantasias exóticas participaram da festa. Depois da lavagem, a festa prossegue nas barraquinhas de comidas e bebidas típicas até a madrugada. A partir de hoje, a igreja reabre para a programação católica que prossegue até domingo.

Estado.com.Br
Biaggio Talento

Salvador – As homenagens ao santo mais popular da Bahia, Nosso Senhor do Bonfim, cujo novenário (período de celebrações) foi iniciado no último final de semana, culminam nesta quinta-feira na tradicional Lavagem do Bonfim, a principal festa popular do verão de Salvador depois do carnaval.

São esperadas cerca de um milhão de pessoas na romaria de oito quilômetros que vai da Igreja da Conceição da Praia, próxima do Mercado Modelo, à Igreja do Bonfim. O cortejo é comandado por 300 “baianas” tipicamente vestidas com saia rodada, pano da costa, colares de contas e o vaso com água de cheiro.

Antes do inicio da romaria haverá um culto ecumênico reunindo católicos, judeus, muçulmanos, espíritas e adeptos do candomblé. Eles vão rezar pela paz mundial. Durante o cortejo, atrás das “baianas” seguem políticos, autoridades, carroças puxadas por cavalos e 70 entidades carnavalescas que animam fiéis e foliões durante o longo percurso.

Considerada uma festa pagã pela Arquidiocese de Salvador, a lavagem, que anteriormente era feita dentro da Igreja do Bonfim, se restringe ao adro e às escadarias. Desde o século 19, a igreja permanece fechada durante a festa.

A devoção ao Senhor do Bonfim foi trazida para a Bahia em 1740 pelo comandante da Nau da Índia, o português Theodósio Rodrigues de Farias. Ele mandou fazer em pinho de riga uma réplica da imagem do santo existente na sua cidade natal, Setúbal, para entronizar no templo construído em Salvador em 1754.

Rapidamente o santo caiu no gosto dos baianos, que passaram a lhe atribuir milagres e graças alcançadas. No inicio do século 19, com a transferência para o Bonfim da imagem e devoção de São Gonçalo de Amarante, cultuado por escravos, a Igreja do Bonfim passou a ser uma referência do sincretismo religioso da Bahia.

Ao longo dos anos, os adeptos do candomblé passaram a identificar Senhor do Bonfim com Oxalá e a festa se popularizou mais ainda. A romaria dos fiéis realizada para lavar a parte interna da igreja para a festa católica se transformou na atual Lavagem do Bonfim.

Estado.com.br
Livro de Cida Nóbrega e Regina Echeverria narra a trajetória do fotógrafo
Haroldo Ceravolo Sereza

Em 1937, o fotógrafo da agência Alliance Photo Pierre Verger é escalado, pela agente Maria Eisner, para a cobertura da ocupação da China pelos japoneses. Era a Segunda Guerra Mundial em seu início – na Ásia. O francês para chegar até Xangai, teria dificuldades para atravessar a Rússia:

a profissão informada pelo seu passaporte – fotógrafo – geraria fortes suspeitas de espionagem. Verger, então, foi aconselhado a tirar um novo documento, com a palavra etnólogo preenchendo o espaço destinado à profissão.

A necessidade, assim, antecipou em uma década a realidade. É na segunda metade da década de 1940, depois de muitas outras viagens e peripécias, que Pierre Verger (1902-1996) chega a Salvador (BA) e passa a viver e registrar as relações entre o candomblé da Bahia e o africano, em Benin. A história do passaporte é relatada em Verger – Um Retrato em Preto e Branco (Corrupio, 484 págs., R$ 90), lançado com um pequeno atraso para marcar as comemorações do centenário de nascimento do fotógrafo. A obra é assinada pela editora Cida Nóbrega e pela jornalista Regina Echeverria. Como defende Rosane de Andrade em Fotografia e Antropologia (Estação Liberdade, 132 págs., R$ 28), é a profissão de fotógrafo que vai, progressivamente, levando Verger à etnologia.

“Procuramos mostrar como ele conseguiu construir seu caminho, partindo do nada”, afirma Cida Nóbrega. “É uma biografia viva, porque, além de ouvirmos muitos de seus amigos e de gente de santo, éramos muito próximos: viajávamos com ele, cuidávamos dele quando ficava doente.” Cida, quando usa o plural, refere-se à turma da editora Corrupio, criada por Arlete Soares para editar em português as obras de Verger (e da qual ainda se deve citar Rina Angulo) – que, apesar de viver no Brasil e de ter trabalhado como fotógrafo de periódicos do País, só havia publicado seus estudos sobre o candomblé na França.

Regina não conheceu Verger pessoalmente. “Sabia dele o que todos sabiam: que era um fotógrafo que se interessou pela cultura negra da Bahia”, conta.

“Descobri um homem livre e despojado.” Regina é também autora das biografias de Cazuza e de Elis Regina.

A biografia, fartamente ilustrada, procura descrever como a vida de Verger o levou à Bahia. Respeita, em grande medida, a vida pessoal do etnólogo, especialmente quando o assunto é sua sexualidade. “Contamos só o que era necessário para descrever sua personalidade”, diz Cida. “Ele era muito reservado.”

A biografia de Verger também recupera a importante história da Corrupio – a responsável pela publicação no Brasil de livros como Orixás e Fluxo e Refluxo do Tráfico de Escravos entre o Golfo de Benin e a Bahia de Todos os Santos.

Liberdade – Nascido em Paris, descendendo de uma família burguesa belga, Verger vivia no bairro mais caro da capital francesa. Sua vida começa a mudar em 1930, quando conhece Eugène Huni e Maurice Baquet, e vai morar com eles num subúrbio parisiense.

Em 1932, morre a mãe, seu último elo com o mundo da alta burguesia parisiense. Aproxima-se de jovens esquerdistas e artistas e chega a freqüentar, em 1936, o Groupe Octobre, mas seu caminho é, claramente, mais individual. Em julho do 1932 mesmo, parte a pé pelo sul da França, com Pierre Boucher, que lhe inicia na fotografia. Ainda neste ano, em dezembro, embarca para a Polinésia francesa, para encontrar o amigo Huni.

Ainda nos anos 1930, Verger passa a viver como fotógrafo profissional, trabalhando para várias publicações. Usa, cada vez mais, a profissão para financiar suas viagens pelo mundo. E, de viagem em viagem, ele desembarca em Salvador, em agosto de 1946.

Verger, como lembra o museólogo e artista plástico Emanoel Araújo no prefácio, não foi o único francês a se encantar com o mundo sagrado da Bahia. Araújo cita o sociólogo Roger Bastide, o poeta surrealista Benjamin Peret e o também fotógrafo Marcel Gautherot. Mas nenhum deles passou a viver tão de acordo com as normas do candomblé quanto Verger – que, apesar da cor da pele, se dizia negro por dentro.

Uma das questões por que passa a biografia é a dúvida que sempre existiu e sempre existirá sobre se Verger, de fato, acreditava no candomblé. Ele mesmo se dizia cartesiano. “O fato é que ele cumpria todas as obrigações e vivia como um filho de santo; era absolutamente devoto e leal aos compromissos.”

Verger entrou para a hierarquia do candomblé, incorporou o Fatumbi ao nome e procurou, sempre, respeitar as obrigações de segredo da religião. Também não fazia perguntas, ou pelo menos dizia que não fazia perguntas – um método que, para Regina Echeverria, também deve funcionar para o jornalismo. Na verdade, ele mesmo diz em outros momentos, que gostava de saber o como e não o porquê.

O fato é que as fotos e o conhecimento da religião de Verger levam Théodore Monod, diretor de um instituto de pesquisa francês sobre a África negra, a propor uma bolsa para Verger. Aos poucos, o fotógrafo vai aceitando a condição de etnólogo – e registrando as proximidades entre os cultos iorubas da Bahia e da África. Não apenas isso, Verger atua como uma espécie de “pombo-correio” entre as duas tradições, distanciadas no final do século 19, depois de dois séculos de intensa troca.

Jornal do Brasil Online
Pais-de-santo e evangélicos da BA travam ‘guerra-santa’

Babalorixás acusam bispo da Universal de discriminar candomblé na TV
SALVADOR – Conhecida em todo o Brasil pela sua diversidade religiosa, a população de Salvador tem acompanhado, nos últimos dias, uma verdadeira ”guerra santa” entre pais-de-santo e pastores evangélicos, principalmente os ligados à Igreja Universal do Reino de Deus.

Desde o início da semana passada, oito babalorixás (pais-de-santo) ingressaram na Justiça com ações contra a Igreja Universal do Reino de Deus exigindo direito de resposta no programa Ponto de Luz, exibido pelas televisões Itapoan (retransmissora da Record) e Cabrália (afiliada em Itabuna).

O programa, que vai ao ar de segunda a sexta-feira, utiliza símbolos e elementos do candomblé – quiabo cortado, vasilhames, água, farinha e óleo – para criticar a religião afrodescendente. Apresentador do programa, o bispo Sérgio Corrêa também costuma entrevistar pessoas que, antes da conversão à Universal, teriam participado de rituais de magia negra, feitiçaria e bruxaria em terreiros de candomblé.

O promotor da Justiça e Cidadania, Lidivaldo Brito, encaminhou no último fim de semana um ofício à Rede Record, em Salvador, solicitando todas as fitas do programa desde o início do ano.

– Com a análise das fitas, vamos saber se os evangélicos estão realmente discriminando o candomblé – disse.

A Igreja Universal do informou que só vai comentar sobre a ação dos pais-de-santo quando for notificada pela Justiça.

Além do direito de resposta, os pais-de-santo também pedem uma punição aos responsáveis pelo programa.

– A Constituição, em seu artigo 72, assegura a todos os brasileiros e residentes no país o livre exercício de qualquer culto religioso – disse o babalorixá Paulo Roberto Pinheiro, do terreiro Axé Ieié Yápondá Omim Onilê.

– O que os evangélicos pretendem é segregar os adeptos do candomblé. Vamos reagir à altura – disse o diretor do Centro de Estudos Afro-Orientais), Ubiratan Castro. (Agência Folha)

© 2010 Eleda.org Web design and development by Tami Jo Urban Suffusion WordPress theme by Sayontan Sinha