Correio da Bahia
Exu, o mais humano dos orixás, tem pouca semelhança com o anjo rebelde da história da criação
Adriana Jacob
redacao@correiodabahia.com.br

Intermediário entre os deuses do candomblé e os pobres mortais, Exu é senhor dos destinos, guardião dos caminhos e das encruzilhadas. Só ele pode facilitar a comunicação com os orixás e a ele são prestadas as homenagens iniciais em todas as festas de terreiro. Mas a fama que carrega é injusta – Exu nada tem a ver com o demônio da cultura ocidental. Dono de mistérios insondáveis, este mensageiro dos deuses concilia força, criatividade, poder e astúcia, mas pode se revelar também prestativo e protetor. Na África e entre os estudiosos do candomblé, Exu será sempre sinônimo de vida, liberdade e axé.

Senhor dos caminhos

Reverência a Exu mostra por que o deus da liberdade africano foi sincretizado como demônio no Brasil

É antes da noite cair sobre as águas da Baía de Todos os Santos que começa um dos mais misteriosos rituais dos terreiros de candomblé: o padê de Exu. A cerimônia é feita com toda a pompa nos terreiros tradicionais. De tardinha, os filhos-de-santo ficam em círculo no barracão e curvam os corpos sobre as esteiras, com a cabeça elevada ao encontro dos punhos. No chão, no meio do barracão, um pote de barro com água, uma pequena garrafa de cachaça, uma cuia com farinha de mandioca, sangue e uma garrafa pequena de azeite-de-dendê.

Os atabaques começam a tocar e, de longe, pode-se ouvir as vozes dos filhos e filhas-de-santo cantando para Exu. É hora de despachar o senhor dos caminhos, o orixá mensageiro. O despacho é uma reverência, já que só Exu pode abrir os caminhos para que homens e orixás possam se comunicar. Por isso, é ele que deve ser homenageado primeiro, em todas as festas, antes de qualquer outra divindade. Para a saudação aos outros orixás começar, é preciso contar com a proteção de Exu.

Foi graças a essa proteção que Pedro Archanjo, um dos mais irresistíveis personagens de Jorge Amado, conseguiu escapar de uma grande armadilha. Uma iabá – espécie de filha do diabo – se transformou em uma negra formosa e traçou um plano para acabar com o jeito namorador de Archanjo: iria deixá-lo impotente. O que a iabá não sabia é que Pedro Archanjo era afilhado de Exu.

Foi o orixá que lhe avisou dos planos da inimiga e preparou um encantamento, com direito a banho de folhas e a ebó. Com a ajuda de Exu, o resultado é que o feitiço da iabá não pegou e ela acabou se apaixonando por Archanjo. Deixou de ser diaba e se transformou na bela negra Dorotéia. Tornou-se filha de Iansã e “terminou dagã a dançar o padê de Exu no início das obrigações”.

Mas não é só isso. Como Pierre Verger conta em seu livro Orixás, Exu pode fazer coisas extraordinárias, como carregar numa peneira o óleo que comprou no mercado, sem que esse óleo derrame. Pode ter matado um pássaro ontem, com uma pedra que jogou hoje. Faz o erro virar acerto e o acerto virar erro.

Adorado por uns, temido por outros, Exu é um dos mais misteriosos nomes do panteão das divindades africanas. Suas cores são o vermelho e o preto. Seu dia, a segunda-feira. Muitas histórias se contam sobre ele, e quase todo mundo tem algo a dizer quando o assunto é o orixá, sincretizado pela igreja católica como o diabo. A cerimônia do padê é um indício de que sua importância vai muito além do que se imagina quando se fala no “homem das encruzilhadas”.

Alguns estudiosos, como o doutor em antropologia pela Universidade Nacional do Zaire, professor aposentado de antropologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e professor adjunto da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), Júlio Braga, definem Exu como o mais dinâmico dos orixás. “É ele que impulsiona a vida e cria as condições dialéticas necessárias para a existência”, diz. Exu seria o responsável por promover a percepção do contrário e mostrar o outro lado de uma questão.

Além disso, está ligado à noção de sexualidade, com a função de promover a continuidade da existência. Por isso, na África, é representado, em alguns locais, por um montículo de terra na forma de um homem abaixado, com um falo de tamanho respeitável. Esse falo seria o símbolo de sua função reprodutiva.

Uma função nada compatível com a que a igreja católica lhe denominou no sincretismo religioso. Segundo Verger, “esse detalhe (o pênis ereto) deu motivo a observações escandalizadas, ou divertidas de numerosos viajantes antigos e fizeram-no passar, erradamente, pelo deus da fornicação”. Se o preconceito com todo o candomblé já é grande, quando o assunto é Exu, as proporções aumentam. Basta pensar que nem todo o mundo sabe qual santo corresponde à versão sincrética de Iansã ou a de Omolu, mas quando se fala de Exu, é raro alguém não associá-lo ao diabo.

De fato, Exu é irritável e pode ser astucioso, grosseiro, vaidoso e indecente, mas se tratado com consideração, ele mostra seu lado bom, serviçal e prestativo. Se, ao contrário, esquecerem de lhe oferecer sacrifícios e oferendas, pode-se esperar até por catástrofes. “Exu revela-se, talvez, desta maneira o mais humano dos orixás, nem completamente mau, nem completamente bom”, diz Verger. Por conhecerem o lado protetor de Exu, há pessoas na África que usam orgulhosamente nomes como Ésubíyìí – concebido por Exu – ou Èsùtósin – Exu merece ser adorado.

É possível que, justamente por sua força, tenha sido o mais atacado dos orixás, associado ao mal absoluto. Se aqui ele é temido e indesejado por muitos, na origem africana era diferente, já que não havia o conceito de maldade absoluta. Exu é a figura que traz a noção de contraste. “Ele promove a transparência do mal que está contida na noção do bem”, diz Braga. Além disso, Exu é a força da comunicação. Ele é o mediador dos orixás entre si, dos orixás com os seres humanos – e vice-versa – e mesmo o mediador entre os próprios seres humanos.

O sistema religioso está baseado na comunicação, através da troca do axé, que possibilita a harmonia da existência. A oferenda é o fator de equilíbrio, e todo desequilíbrio é recomposto por uma oferta. Como Exu é o mediador, é através dele que a oferta é levada ao orixá. Nesse sistema, Exu é a figura chave, já que somente através dele pode acontecer a troca de axé.

Logo, todo ato religioso precisa de sua presença e, por isso mesmo, todo ato religioso no candomblé é iniciado com uma oferenda a ele. Como explica Volney J. Berkenbrock em seu livro A experiência dos orixás, “Exu é a faísca que inicia o processo. É o princípio de tudo, a força da criação, o nascimento, o equilíbrio negativo do universo, o que não quer dizer coisa ruim. Exu é a célula mater de geração da vida, o que gera o infinito, infinitas vezes”.

Por conta de tudo o que se disse e ainda se diz sobre ele, a imagem de Exu por vezes parece bem próxima e clara. Outras horas, parece estar envolta em névoa. Talvez, todo esse mistério e toda a confusão que fazem com seu nome tenham sido a causa de sua figura haver inspirado inúmeros acadêmicos e artistas a se debruçarem sobre sua personalidade.

Amante dos mistérios da Bahia e do candomblé, com Jorge Amado não foi diferente. Segundo o escritor, “Exu come tudo que a boca come, bebe cachaça, é um cavalheiro andante e um menino reinador. Gosta de balbúrdia, senhor dos caminhos, mensageiro dos deuses, correio dos orixás, um capeta. Por tudo isso sincretizaram-no com o diabo: em verdade ele é apenas um orixá do movimento, amigo de um bafafá, de uma confusão, mas, no fundo, uma excelente pessoa. De certa maneira, é o não onde só existe o sim; o contra em meio do a favor; o intrépido e o invencível”.

Correio da Bahia
Eshu, el más humano de los orishás, tiene poca semejanza con el ángel rebelde de la historia de la creación
Adriana Jacob
redacao@correiodabahia.com.br

Intermediario entre los dioses del Candomblé y los pobres mortales, Eshú es el señor de los destinos, guardiero de los caminos y de las encrucijadas. Solo el puede facilitar la comunicación con los orishas y es a él solo que se le presta homenaje al iniciar toda fiesta de los terreiros. Mas la fama que carga es injusta – Eshú nada tiene que ver con el demonio de la cultura occidental. Dueño de misterios inmedibles, este mensajero de los dioses concilia fuerza, creatividad, poder y astucia, además pode también ser caritativo y protector. En África y entre los estudiosos del candomblé, Eshú será siempre sinónimo de vida, libertad y ashé.

Señor de los caminos

La reverencia a Eshú muestra por que el dios de la libertad africano fue sincretizado con el demonio en Brasil

Es antes de la caída de la noche sobre las aguas de Bahía de Todos los Santos que comienza uno de los más misteriosos rituales de los terreiros de candomblé: el padê de Eshú. La ceremonia es hecha con toda la pompa de nuestros terreiros tradicionales. Al atardecer, los hijos-de-santo se arrodillan en un círculo en el barracón (salón grande en el terreiro) y agachan sus cuerpos sobre las esteras, con la cabeza sostenida sobre los dos puños. En el suelo, en el medio del barracón, se haya una tinaja de barro con agua, un pequeño porrón con aguardiente, una cazuela de barro con harina de yuca, sangre y un porrón pequeño con manteca de corojo.

Los tambores comienzan a tocar y, desde lejos, se puede escuchar las voces de los hijos e hijas-de-santo cantando para Eshú. Es hora de despachar al señor de los caminos, el orishá mensajero. El despacho es una reverencia, ya que solo Eshú puede abrir los caminos para que hombres y orishás se puedan comunicar. Por eso, es él quien debe ser homenajeado primero, en todas las fiestas, antes de cualquier otra divinidad. Para que el saludo a los otros orishás pueda comenzar, es preciso contar con la protección de Eshú.

Fue gracias a esa protección que Pedro Archanjo, uno de los más irresistibles personajes del novelista Jorge Amado, consiguió escapar de una gran trampa. Una iyabá – especie de hija del diablo – se transformó en una hermosa negra y trazó un plan para acabar con el encanto de Archanjo: lo dejaría impotente. Lo que la iyabá no sabía era que Pedro Archanjo era ahijado de Eshú.

Fue el orishá que le aviso de los planos de su enemiga y preparó un encantamiento, con un baño de hojas y un ebó. Con la ayuda de Eshú, el resultado es que la brujería de la iyabá no pegó y ella acabó locamente enamorada de Archanjo. Dejo de ser diabla y se transformo en la bella negra Dorotea. Se hizo hija de Iyansán y “terminó obligada a ser la que baila el padê de Eshu al inicio de las obligaciones”.

Mas no es solo eso. Como cuenta Pierre Verger en su libro Orixás, Eshú puede hacer cosas extraordinarias, como cargar en un colador el aceite que compro en el mercado, sin que el aceite se derrame. Puede matar un pájaro ayer con una piedra que tiró hoy. Hace que la mentira se vuelva verdad o la verdad se vuelva mentira.

Adorado por unos, temido por otros, Eshú es uno de los mas misteriosos nombres del panteón de las divinidades africanas. Sus colores son el rojo o el negro. Su día, es el lunes. Muchas historias se cuentan sobre el, y casi todo el mundo tiene algo que decir cuando el asunto es acerca del orishá, sincretizado por la iglesia católica con el diablo. La ceremonia del padê es un indicio de que su importancia va mucho mas allá de lo que se imagina cuando se habla del “hombre de las encrucijadas”.

Algunos estudiosos, como el doctor en antropología de la Universidad Nacional de Zaire, profesor retirado de antropología de la Universidad Federal de Bahia (UFBA) y profesor adjunto de la Universidad Estatal de Feira de Santana (UEFS), Júlio Braga, define a Eshú como el mas dinámico de los orishás. “Es él que impulsa la vida y crea las condiciones dialécticas necesarias para la existencia”, dice. Eshú sería el responsable por promover la percepción de lo que es contrario y mostrar el otro lado de un asunto.

Además de eso, está ligado a la noción de la sexualidad, con l a función de promover l a continuidad de la existencia. Por eso, en África, es representado, en algunos lugares, por un montículo de tierra con la forma de un hombre pequeño, con un falo de tamaño respetable. Ese falo sería el símbolo de su función reproductiva.

Una función nada compatible con la que l a iglesia católica le denominó en el sincretismo religioso. Según Verger, “ese detalle (el pene erecto) dio motivo a las observaciones escandalizadas o divertidas de numerosos viajantes antiguos quienes lo identificaron, erradamente, como el dios de la fornicación”. Si el preconcepto con todo l o referente al candomblé de por sí es grande, cuando el asunto trata de Eshú, l as proporciones aumentan. Basta pensar que no todo el mundo sabe cual santo corresponde a la versión sincrética de Iyansá o la de Omolu[Babaluaiyé], mas cuando se habla de Eshú, es raro que alguien no lo asocie con el diablo.

De hecho, Eshú es irritable y puede ser astuto, grosero, vanidoso e indecente, mas si es tratado con consideración, él muestra su lado bueno, servicial y caritativo. Si, al contrario, olvidaran de hacerle sacrificios y ofrendas, se pueden esperar hasta catástrofes. “Eshú se revela, talvez, de esta manera siendo el más humano de los orishás, ni completamente malo, ni completamente bueno”, dice Verger. Porque conocen el aspecto protectivo de Eshú, hay personas en África que usan orgullosamente nombres como Éshubíyìí – concebido por Eshú – o Èshùtósin – Eshú merece ser adorado.

Es posible que, justamente por su fuerza, haya sido el más atacado de los orishás, asociado al mal absoluto. Si aquí él es temido e indeseado por muchos, su origen africano era diferente, ya que no había un concepto de maldad absoluta. Eshú es l a figura que trae l a noción de contraste. “Él promueve l a transparencia del mal que está contenida en la noción del bien”, dice Braga. Aparte de eso, Eshú es l a fuerza de la comunicación. Él es el mediador de los orishás entre sí, de los orishás con l os seres humanos – y vise-versa – y es el mismo el mediador entre l os propios seres humanos.

El sistema religioso está basado en la comunicación, a través del intercambio del ashé, que posibilita l a harmonía de la existencia. La ofrenda es el factor de equilibrio, y todo desequilibrio es recompuesto por una oferta. Como Eshú es el mediador, es a través de él que la oferta es llevada al orishá. Es este sistema, Eshú es la figura clave, ya que solamente a través de él es que puede tener lugar el intercambio de ashé.

Luego, todo acto religioso precisa de su presencia y, por eso mismo, todo acto religioso en el candomblé es iniciado con una ofrenda a él. Como explica Volney J. Berkenbrock en su libro La Experiencia de los Orishás, “Eshú es la chispa que inicia el proceso. Es el principio de todo, la fuerza de la creación, el nacimiento, el equilibrio negativo del universo, el que no quiere decir cosas malas. Eshú es la célula mater de la generación de la vida, el que genera el infinito, infinitas veces”.

Por cuenta de todo lo que se ha dicho y aún se dice sobre él, la imagen de Eshú por veces parece bien próxima y clara. Otras veces parece estar envuelta en una niebla. Talvez, todo ese misterio y toda la confusión que hacen con su nombre hayan sido la causa de que su figura haya inspirado a numerosos académicos y artistas a inclinarse hacia su personalidad.

Amante de los misterios de Bahia y del candomblé como lo fue Jorge Amado no lo habrá jamás. Según el escritor, “Eshú come todo que l a boca come, bebe aguardiente, es un caballero andante y un niño rey. Gusta de los bullicios, señor de los caminos, mensajero de los dioses, correo de los orishás, un niño inquieto. Por todo esto lo sincretizaron con el diablo: en verdad él es apenas un orishá de movimiento, amigo de las bromas, de una confusión, más, en el fondo, una excelente persona. De cierta manera, es el no donde solo existe el sí; el contrario en medio del favor; el intrépido y el invencible”.

Correio da Bahia
Eshu, the most human of the orishas, has little resemblance with the fallen angel of the creation story
Adriana Jacob
redacao@correiodabahia.com.br

Intermediary between the mortal Gods of the Candomblé and poor men, Eshú is the gentleman of destiny, guardian of the passageways and of the crossroads. He is the only one that can ensure communication with the orishas and is also the only deity to whom tribute must be paid when initiating any celebration in the terreiro. But the reputation that is attributed to him is unjust – Eshú has nothing to do with the devil of western culture. Owner of innumerable mysteries, this messenger of the gods conciliates force, creativity, power and cleverness, charitable and protective. In Africa and amongst the students of Candomblé, Eshú will be always synonymous with life, freedom and ashé.

Gentleman of the roads

The worship of Eshú indicates why the African god of freedom was syncretized with the devil in Brazil

Before night falls on the waters of the Bay of All Saints (Bahía de Todos os santos) one of the most mysterious rituals carried out in Candomblé terreiros begins: the padê of Eshú. In the traditional terreiros, the ceremony is executed with much pomp. At dusk, the filho-do-santo kneel down in a circle in the large barracão (great hall in terreiro) and bend their bodies on the mats, with their heads resting on both fists. On the ground, in the center of the barracão, a clay jar filled with water, a small jar with firewater (overproof rum), a clay dish with yucca flour, and a small jar with palm oil.

The drums begin to play and, from a distant spot, it is possible to hear the voices of the filhos-do-santo singing for Eshú. It is time to “dispatch” or send the offerings to the gentleman of the roads, the messenger orishá. The offering is an importante reverence, since only Eshú can pave the way so that men and orishás can communicate. For that reason, he is the first orishá that must be acknowledged, in all the celebrations, before any other divinity. So that the greeting to the other orishás can begin, it is necessary to count with the protection of Eshú.

It was thanks to that protection that Pedro Archanjo, one of Jorge Amado’s most irresistible characters, was able to escape from a great trap. One iyabá – a type of wicked entity – was transformed into a beautiful black woman and she drew up a plan to finish with Archanjo’s appeal: she would leave him impotent. What iyabá did not know was that Pedro Archanjo was a odson of Eshú.

Eshú warned him of his enemies’ plans and prepared a special charm for him, that included a a bath with special leaves and ebó. With the aid of Eshú, the result was that the witchcraft of iyabá did not harm him and she ended up madly in love with with Archanjo. She changed from being an evil entity and became the beautiful Dorote Preta. She became a daughter of Iyansán and “she ended up being the one that dances the padê of Eshú at the beginning of the obligations”.

But Eshú is much more than that. As Pierre Verger describes in his book “Orixás,” Eshú can make things extraordinary, like carrying in a strainer the oil that we buy in the market without spilling a drop. He can kill a bird yesterday with a stone he threw today. He causes that the lie becomes truth and that truth becomes a lie.

Adored by some and feared by others, Eshú is one of the most mysterious names of the pantheon of African divinities. His colors are red and black. His day is Monday. Many stories are told, and almost everyone has something to say when the subject is about the orishá syncretized by the Catholic Church with the devil. The ceremony of padê is an indicator that Eshú’s importance goes beyond what most people imagine when they speak of the “man of the crossroads”.

Some scholars, such as Dr. Julio Braga, anthropologist from the National University of Zaire, and retired professor of anthropology of the Federal University of Bahia (UFBA) and attached professor of the State University of Feira de Santana (UEFS), define Eshú as the most dynamic of the orishás. “He is the one who thrusts life forward and creates the necessary dialectic conditions for existence,” he says. Eshú is responsible for promoting the opposite perception and show the other side of a debate.

In addition to that, he is bound to the notion of sexuality, in charge of promoting the continuity of human existence. For this reason, in some ares of Africa he is represented by an earthen mound in the form of a small man, with a phallus of a very respectable size. That phallus represents his reproductive functions.

A not at all compatible function with which the Catholic Church associated him in the process of religious syncretism. According to Verger, “that detail (the turgid penis) gave rise to the scandalized or amused observations of numerous travelers who identified him erroneously as the god of fornication.” If the preconceptions of all things related with Candomblé are numerous, when the subject is Eshú, the proportions increase. This is evident when considering that not everyone knows the saint that corresponds with the syncretic version of Iyansá or of Omolu [Babaluaiyé], but when it comes to Eshú, it is a rare occurrence that anybody would not associate him with the devil.

In fact, Eshú is irritable and is also very astute, crude, vain and indecent, but if he is treated with consideration, he shows his good, helpful and charitable side. If, on the contrary, they forget to do sacrifices and offerings to him, one can come to expect catastrophes. “Eshú rebels in this manner, being the most human of the orishás, neither completely bad, nor completely good,” says Verger. Because they know Eshú’s protective qualities, there are people in Africa who proudly use names such as Éshubíyìí – conceived by Eshú – or Èshùtósin – Eshú deserves to be adored.

It is possible that because of his nature, he has been the most attacked of the orishás, associated with absolute evil. If here he is feared and undesired by many, in his place of origin it was somewhat different, since there was no concept of absolute evil. Eshú is the character that brings to life the notion of resistance. “He promotes the transparency of the evil that is contained in the notion of goodness,” says Braga. besides this, Eshú represents the notion of communication. He is the mediator of the orishás with each other, between orishás and human beings – and vise versa- and is also the mediator between human beings.

The religious system is based on communication, through the interchange of ashé, that makes possible the harmony of existence. Offering are the balance factor, and all imbalance is recomposed by supply. As Eshú is the mediator, it is through him that offerings are taken to the other orishás. In this system, Eshú is the key figure, since only through him can the interchange of ashé can take place.

In addition, all religious acts require his presence and, for that same reason, all religious acts in Candomblé are initiated with an offering to him. As explained by Volney J. Berkenbrock in his book “La Experiencia de los Orishás,” “Eshú is the spark that initiates the process. He is the principle of everything, the force of creation, the birth, the negative balance of the universe, the one that does not mean to say bad things. Eshú is the mother cell that generates life, the one that generates the infinite, infinite times.”

Because of everything that has been said and is still said about him, the image of Eshú at times seems close and clear. Other times it seems to be surrounded by fog. Possibly, all that mystery and all the confusion that has been created around his name are the reason that many academics and artists feel particulally inclined towards his personality.

No one will ever be as much of a lover of the mysteries of Bahia and Candomblé as was Jorge Amado. According to the writer, “Eshú eats everything that the mouth eats, drinks brandy, is a wandering gentleman, and a young king. He enjoys noise, gentleman of the roads, messenger of the gods, mailman of the orishás, an anxious boy. It is because of all of this that they have syncretized him with the devil: in reality he just the orishá of movement, lover of hoaxes, of confusion, yet, at heart, an excellent person. In some ways, he is the “no” where only the “yes” exists; the opponent in the way of the favor; the intrepid and the invincible one.”

From Brazil’s Correio da Bahia
Correio da Bahia
Prefeito conferiu os trabalhos de reforma no mais antigo santuário de candomblé da cidade
Andreia Santana
redacao@correiodabahia.com.br

Antonio Imbassahy aprecia o gradil de ferro confeccionado por Bel Borba

O prefeito Antonio Imbassahy esteve ontem pela manhã no terreiro da Casa Branca, na Avenida Vasco da Gama, conferindo o andamento das obras de reforma do principal santuário do candomblé em Salvador. Acompanhado do presidente da Fundação Gregório de Mattos, Francisco Sena, e do artista plástico Bel Borba, o prefeito conheceu o gradil de ferro decorado com motivos africanos e símbolos da religião afro-brasileira, de autoria do artista, e que foi instalado na Praça de Oxum, na entrada do terreiro. Depois da visita, ele se dirigiu até a casa de Xangô para cumprimentar mãe Tatá (Almira Cecília dos Santos) ialorixá da Casa Branca.

Até agora, já foram feitas obras de contenção da encosta e drenagem da água pluvial no terreiro. Ainda faltam a urbanização e o projeto de paisagismo da Praça de Oxum. Durante as próximas semanas as obras serão suspensas devido ao Osé, cerimônia de preparação para o ritual das Águas de Oxalá, que acontece na próxima quinta-feira à noite. “A prefeitura está respeitando o calendário festivo do terreiro. Existem cerimônias em que não é permitido fazer escavações ou mexer com a terra. Nesses períodos, as obras são paralisadas para não interromper o ciclo de celebração aos orixás. Nenhuma intervenção pode ser feita aqui dentro sem respeitar os momentos religiosos da casa”, explicou o prefeito.

A cerimônia das Águas de Oxalá é uma das mais importantes do calendário da Casa Branca, informa o antropólogo e ogã do terreiro, Ordep Serra. Segundo ele, Oxalá, por ser o pai dos orixás, é celebrado com uma festa especial, em que todos os participantes usam roupas brancas. Depois da semana de preparação e da festa na quinta-feira, serão guardados mais três domingos em honra ao orixá.

Nesse período, além das obras de reforma que ficarão paralisadas, também é proibida a entrada de qualquer pessoa usando roupas escuras no terreiro e as oferendas aos orixás não podem conter azeite-de-dendê ou temperos fortes. “Este é o período da chamada comida branca”, acrescenta Ordep Serra.

Tombado como patrimônio histórico e cultural desde 1984, o terreiro da Casa Branca, cujo nome em iorubá é Ilê Axé Yá Nassô, é um dos mais antigos de Salvador. Ordep Serra calcula que ele tenha mais de 150 anos. A Casa Branca foi fundada na Barroquinha por três princesas africanas vindas das cidades de Oió e Ketu. Por causa disso, o terreiro é regido por Xangô (rei de Oió) e Oxóssi (rei de Ketu), além de receber também influência de Oxum.

Ainda no século XIX o terreiro foi transferido para a antiga roça do Engenho Velho. Do Ilê Axé Yá Nassô, nome de uma das princesas africanas, tiveram origem mais dois dos principais terreiros da cidade, o Gantois (Ilê Axé Yá Massê), na Federação, e o Ilê Axé Opô Afonjá, na antiga roça de São Gonçalo do Retiro.

From Brazil’s Correio da Bahia
Correio da Bahia
Babalorixá Balbino conta de que forma Xangô o ajudou a se comunicar com africanos no Benin
Hilcélia Falcão
redacao@correiodabahia.com.br

Balbino: “Fiquei impressionado com aquelas mulheres de peitos de fora e aqueles homens de corpo pintado”

Só um deus de justiça poderia estar por trás daquele reencontro. Guiadas pelos desígnios de Xangô, as mãos do antropólogo Pierre Verger levaram Balbino, primeiro filho-de-santo do sexo masculino de Maria Bibiana do Espírito Santo, mãe Senhora do Ilê Axé Opô Afonjá, àquele pequeno povoado na África ancestral. O lugar era Saketê, no Benin, do qual até então ele nunca tinha ouvido falar. Mas o que aconteceria depois o faria percorrer um caminho novo rumo à redescoberta da sua identidade cultural. Balbino Daniel de Paula, 61 anos, ou simplesmente Balbino, como é conhecido em Lauro de Freitas, onde está à frente do terreiro Ilê Axé Opô Aganju, protagonizou em fevereiro de 1973, na sua primeira viagem à África, um dos mais marcantes episódios de sua vida de iniciado no candomblé.

Até então, esse babalorixá neto de escravos tinha a impressão de já estar acostumado às intervenções dos orixás. Afinal, crescera em Ponta de Areia, na Ilha de Itaparica, no terreiro de culto aos eguns de seu pai biológico, Pedro Daniel de Paula (Alapinin). “Até os 12 anos não podíamos ver a festa à noite, por isso ficávamos felizes quando tínhamos a oportunidade de dar presentes a Bababê na festa dele, ele dava ecó (acaçá) para a gente e mãe Senhora ia sempre lá, ela fazia obrigação de babalorixá”, conta Balbino. Acostumado aos mistérios da religião afro-baiana, disputava as malas dos veranistas para conseguir o dinheirinho de comprar presentes para o egun.

Foi nesta época, quando tinha apenas 6 anos, que conheceu o antropólogo Pierre Verger. Naquele tempo, o francês de alma afrobaiana ia a Itaparica acompanhado de mãe Senhora, que viria a ser mais tarde a mãe-de-santo do hoje babalorixá. “Ficava impressionado com a figura daquela mulher. A minha relação com a minha mãe era tão carinhosa que ela até me botou um apelido, Negrito, era assim que ela me chamava”, relembra, com os olhos marejados de lágrimas. Não é para menos. Para mãe Senhora, Balbino era o seu xodó.

Trágico episódio

Até ser iniciado por ela no culto afro, entretanto, muitas águas tiveram que rolar. Por motivos que ele até hoje desconhece, até ser encaminhado ao Ilê Axé Opô Afonjá, vivenciou uma experiência curiosa em outro terreiro de candomblé. Duas de suas irmãs já tinham sido feitas de santo no terreiro de São Gonçalo do Retiro. Mas ele, não. Continuava na sua rotina de verdureiro nas feiras livres de Salvador. Até que, por problemas de saúde, foi encaminhado a um terreiro na Federação. Contudo, um trágico episódio abortou o seu processo de iniciação. “O pai-de-santo, pai Vidal, de Oxagrian, morreu sete dias depois d”eu ter sido recolhido lá”, conta. Voltou para casa sem passar pela iniciação.

Foi quando Xangô interviu e modificou para sempre o seu destino. Irradiado pelo santo da sua cabeça, o feirante foi parar no Ilê Axé Afonjá, em São Gonçalo do Retiro. “Nunca entendi porque minha mãe não me levou logo pro Afonjá”, conta, intrigado. Feito de santo, ficou mais próximo de mãe Senhora e sua vida começou a mudar. Passou a conviver com personalidades de destaque, como Jorge Amado e Pierre Verger. “Tudo foi acontecendo de uma hora para outra”. Sempre amigo, o francês costumava lhe trazer do continente africano produtos relacionados ao candomblé. “E eu sempre pedia a ele (Verger): ”Me leva para a África?”. Ele me respondia: ”Um dia Xangô vai te levar””, recorda.

Reencontro ancestral

A mesma força mística que o conduzira ao Afonjá, naquele distante ano de 1959, parece ter regido todos os momentos até Saketê. O reencontro foi inusitado. “Quando cheguei, fiquei impressionado com aquelas mulheres de peitos de fora e aqueles homens de corpo pintado, nunca tinha visto coisa igual”, relembra Balbino que, depois desta época, voltou à África outras três vezes. Só que a estética da tribo não era nada diante do impacto no momento da comunicação com os seus “irmãos”. Perplexo pela identificação que sentira apesar de tanta diferença, Balbino ouviu, entre surpreso e confuso, a ordem de Verger: “Você não queria vir? Agora que você está aqui se comunique com o seu povo”.

Ele não sabia o que fazer. Não conhecia nada do idioma daquele povo de Saketê. O jeito foi, claro, recorrer a Xangô. Rezou, pediu, até que sua mente pareceu se iluminar. “Me veio a cantiga de Xangô e cantei em iorubá. Cantei uma, duas vezes, e nada. Eles só faziam me olhar”. Na terceira, todos eles pegaram o xerê e cantaram junto com Balbino. “Foi demais”, fala, com a voz embargada de quem não esquece aquele momento.

Voltou da África mudado e agora quem visita o terreiro onde o pai-de-santo mantém uma creche para 60 crianças da comunidade pobre de Lauro de Freitas, pode ver ali a síntese da identidade cultural do filho de Alapinin. O nome estranho da rua do Ilê Axé Opô Aganju, que reproduz o leiaute adotado por mãe Senhora no Afonjá, é, para os povos do Benin, muito familiar: Saketê, o lugar do seu reencontro ancestral.

© 2010 Eleda.org Web design and development by Tami Jo Urban Suffusion WordPress theme by Sayontan Sinha