A Espada e o Raio
por Natalia Bolívar
Traduzido perto Ricardo Ferreira do Amaral, advogado, artista plástico e filho de Airá.
Da Revista Cuba Encuentro en la Red Cubaencuentro

Santa Bárbara nasceu na Nicomédia, capital da Betânia, na Turquia asiática. Dióscoro, seu pai, de origem judia, militar de carreira, rico, orgulhoso e brutal, encerrou-a em uma torre que só tinha um fosso e duas janelas por onde entrava o sol, seu único privilégio.

Ao partir para a guerra, seu pai deixou-a rodeada de luxos e mestres famosos para que assim obtivesse uma educação como correspondia à sua posição social.

Com o tempo, Bárbara foi se apercebendo da falsidade da doutrina pagã e das suas divindades. Ainda que Roma dominasse o mundo, pôde fazer chegar uma mensagem ao sábio católico Orígenes, que lhe enviou um de seus discípulos, Valêncio, quem a instruiu nos livros sagrados, a fé cristã e a batizou.

Ao regressar da guerra, seu pai encontrou-a mudada e instou que lhe dissesse a causa da sua mudança, ao que Bárbara se confessou cristã. Dióscoro tratou de dissuadi-la, mas ela continuava confessando-se cristã. Foi entregue à justiça do pretor Marciano, quem mandou que fosse açoitada durante três dias. Deitaram-na sobre pedaços de vidro e pontas de lança, abriram suas feridas com sal e vinagre e lançaram-na num calabouço escuro. Ali se lhe apareceu Jesus, quem curou suas feridas e alimentou sua fé cristã. Ao vê-la o pretor com forças e intuindo o milagre, mandou que a torturassem novamente, enquanto ela seguia sorrindo, orando, firme em sua fé cristã. Foi então, que a expuseram nua por toda a cidade lhe dando açoites. Uma vez humilhada e sem lograr que negasse Jesus, foi sentenciada à morte. Seu pai foi o verdugo, sacou sua espada e degolou-a.

De volta a casa, Dióscoro, em companhia do pretor Marciano, foram mortos por um raio, ante um céu sereno e sem nuvens. Isto ocorreu ao redor do ano 238.

A festa patronal desta virgem-mártir celebra-se em 4 de dezembro, ainda que em 1969 tenha desaparecido do calendário romano.

Por sua parte, Changó chega a Cuba nos barcos negreiros que transportavam grandes cargas de escravos para trabalhar nas plantações do novo continente. Com os escravos veio este orixá, seu culto, seus relatos, sua vitalidade e colorido; a partir de então, foi transmitindo-se de pais a filhos a través da memória oral. Foi assim como se assentou em nossa terra.

Changó é um orixá ou divindade maior. É deus do fogo, do raio, do trovão, da guerra, dos ilú-batá, da dança, da música e da beleza viril. É padroeiro dos guerreiros e dos artilheiros. Este orixá é filho de Ibaíbo e de Yemmú.

A Changó se lhe atribuem muitas virtudes e defeitos dos homens. É bom trabalhador, muito valente, amigo digno de se apreciar, adivinho; também é algo mentiroso, mulherengo, em algumas ocasiões briguento, jactancioso e jogador. Como pai, se ocupa do filho enquanto este lhe obedeça, mas não o admite covarde. Os Ibeyis são seus filhos. Changó também possui inumeráveis amantes, o que não lhe impede de ter suas próprias mulheres: Oyá, Obba Yurú e Ochún.

Este orixá é muito respeitoso com os egguns. Às vezes, se lhe representa a cavalo como um soldado. Na terra ioruba, Nigéria, esta divindade era rei da cidade de Oyó; diz-se que cometeu suicídio e a partir de então se converteu em orixá.

Existem diversas lendas ou pattakíes em Cuba que se referem à história de Changó, muitas delas encontram-se plasmadas em antigas livretas, ordenadas segundo os odus do sistema divinatório de Ifá em que esta divindade fala, e outras delas, recolhidas pela tradição oral do nosso povo; uma delas conta:

Changó desafiava Oggún ao transformar Oyá em sua mulher. Estando o amante na casa de Oyá, dona dos relâmpagos e dos temporais, de pronto, inteirado, apareceu Oggún; rodeou a casa com um exército formado por todo tipo de armas feitas na sua frágua; interpelava bruscamente Changó para que saísse e o enfrentasse em batalha.

Oyá, muito respeitada e querida em seu povo, e sob a influência do seu amor por Changó, cortou suas longas tranças; tirou também a sua saia de nove cores e seu lenço. Vestiu Changó com tudo isto. Logo, abriu a porta da sua casa e Changó, vestido com a indumentária de sua amante, abriu passo entre a multidão, imitando o majestoso passo de Oyá. Vestido assim conseguiu escapar da ira de Oggún, seu eterno rival no amor.

Seria muito extenso narrar as múltiplas facetas da vida de Changó.

Este orixá é capaz de resumir em si mesmo todas as virtudes e defeitos e, como pode se observar, nem a história, nem o relato sobre a origem de Santa Bárbara e de Changó guardam algo em comum, mais bem se trata de duas histórias que mostram um certo paralelismo até que a própria vida os põe em solo cubano e se unificam as duas tradições das culturas africana e européia.

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